A AL recebeu uma carta da Associação de Jornalistas, reivindicando a eliminação de pelo menos dois artigos na proposta de revisão da lei sobre a utilização de símbolos nacionais, um dos quais define que o Governo pode exigir que a imprensa colabore com os trabalhos de divulgação do hino. A associação considera que o artigo pode afectar a liberdade de imprensa e a autonomia editorial, sendo que em causa pode estar uma diferente interpretação do Chinês. Em reacção, Sónia Chan procurou afastar receios, assegurando que a comunicação social apenas tem de “coordenar” com o Governo
Rima Cui e Inês Almeida
A Associação de Jornalistas de Macau entregou ontem uma carta à Assembleia Legislativa (AL), pedindo que seja retirado um artigo da proposta de revisão da lei de utilização e protecção da bandeira, emblema e hino nacionais.
Na proposta em chinês foi escolhida a palavra em chinês “yaoqiu” (要求) cujo significado é mais forte e está ligado a exigência. Deste modo, a associação interpreta a cláusula no sentido de que “o Governo pode exigir aos meios de comunicação social que colaborem com os trabalhos de divulgação do hino nacional e na promoção da etiqueta e conhecimentos sobre como cantar hino”.
Já em Português é usada a palavra “solicitar”, cujo significado inclui pedir com instância, pedir através de meios formais ou convencionados e tentar obter algo. No artigo em português, consta que o Governo “pode solicitar (…) que se adeqúem aos desenvolvimento das acções de divulgação sobre o hino por si desenvolvidas, com vista à promoção dos conhecimentos alusivos ao cerimonial de execução instrumental e vocal do mesmo”.
Na missiva, a associação sublinhou que o artigo pode afectar a liberdade de imprensa e a autonomia editorial e que foi adicionado à proposta apenas de acordo com a “vontade burocrática” do Executivo, sem ter consultado associações de comunicação social e sem que o documento fosse sujeito a discussão pública, o que é “externamente desadequado”.
Nesse sentido, a associação sugere que as autoridades comprem publicidade nos meios de comunicação social para assim poderem publicar esses comunicados de divulgação do hino.
A proposta da alteração do regime jurídico está a ser discutida na especialidade pela 1ª Comissão Permanente da AL. Para a associação representativa dos jornalistas chineses, embora o Executivo explique que, caso a imprensa não colabore na divulgação do hino nacional, não haverá sanções, “a imprensa não é uma máquina de divulgação do poder político, nem tem o dever de colaborar com a alegada ‘exigência’ do Governo”.
“Além disso, o Executivo usou a palavra ‘exigir’ que tem um sentido de obrigação. Mesmo que não haja punições, a lei concede ao Governo o poder de ‘exigir’ que a imprensa faça essas coisas. Se um dia, tal estipulação passar a ser implementada, irá provocar uma controvérsia desnecessária. É preocupante que, com a legislação, o Governo possa intervir ainda mais na liberdade de imprensa e na autonomia editorial”, salientou.
Por outro lado, segundo o artigo 7-A da proposta, a TDM e a Rádio Vilaverde precisam de emitir o hino nacional ou as informações de áudio e vídeo do hino nacional prestadas pelo Governo, nas celebrações e festivais importantes. A 1ª Comissão da AL tinha afirmado que, como as referidas entidades obtiveram licença para operar, o Executivo pondera acrescentar esse artigo nos contratos de adjudicação para avaliar cautelosamente se renova ou não a licença com os canais televisivos e estações de rádio que não respeitem as exigências de emissão do hino nacional sem nenhum motivo.
Para a Associação de Jornalistas, a Lei de Imprensa e o regime jurídico da actividade de radiodifusão televisiva e sonora já indicam que os jornais e as entidades de radiodifusão precisam de emitir notas oficiais, mensagens e notas oficiosas. Assim, acrescentar um critério para a renovação da licença de entidades de radiodifusão ligado à divulgação do hino nacional é “irrazoável e ridículo”.
A medida pode diminuir a margem de liberdade da imprensa, entende a associação, instando o Governo a eliminar também esse artigo.
Além disso, quer que seja garantida a emissão das informações relativas ao hino nacional e à respectiva divulgação fora das horas noticiosas.
Por outro lado, a Associação de Jornalistas considera que o Governo deve esclarecer quais serão as medidas para encorajar a imprensa a colaborar melhor com os trabalhos de divulgação do hino nacional, porque entende que a explicação na lei não está muito clara.
Apenas “coordenar”
À margem de uma reunião da Comissão de Acompanhamento para os Assuntos da Administração Pública, a Secretária para a Administração e Justiça foi questionada sobre a carta, assegurando que tem “prestado muita atenção a este assunto”. “Gostaria de esclarecer que não devem ter preocupações em relação a este artigo. É só para dar um dever ou obrigação ao Governo, que tem a responsabilidade de fazer bem a promoção do Hino Nacional. Vocês [comunicação social] só precisam de coordenar com o Governo”, frisou Sónia Chan, recordando que “não há nenhuma sanção pelo não cumprimento”.
“Não vamos limitar a liberdade de imprensa. Queremos é, através destas plataformas de comunicação social, divulgar o hino nacional e alguns conhecimentos sobre o hino”, assegurou.
Ao mesmo tempo, Sónia Chan desvalorizou as preocupações relativamente ao termo “solicitar”, incluído num dos artigos da proposta de lei. “Esperamos que possam coordenar connosco. Isto também tem a ver com a responsabilidade social. Como a Lei do Hino Nacional já está no anexo 3 da Lei Básica, temos de fazer uma lei de acordo com a Lei Básica”. “O Hino Nacional é o símbolo de ‘um país’ e em relação aos ‘dois sistemas’ já temos um tratamento muito flexível na lei”.
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